Brilham os cimentos dos vencidos, a cidade de cal e sonho envolve a noite numa trapaça
Ruas são como espelhos, poéticas em ato, delírios de acasos
Não somos senão uma geografia de ruas que nos vêm do Cosmorama dos cronômetros consumados pelo tempo
Escritas do amanhã talhadas nos ladrilhos do agora
As horas seguem a desabar umas sobre as outras diariamente, como deuses a forjar seus próprios destinos
Um sol escuro ilumina os asfaltos cardíacos
No beco dos girassóis as flores são calculadas, as camisas engolem os passantes e os corações não possuem direção hidráulica
Calçadas flutuam soltas pelas salas de deuses sem deus
Na rua do mundo, somos todos espelhos flutuantes, loterias em primavera
Cidades são hospícios ao céu aberto, hospitais para insones, orações mais do que tardias
Enquanto andamos, cada passo se apresenta como um pequeno museu de desmaio
Uma rua se funde à outra, o asfalto se funde em ruas, a rua se funde ao aviso luminoso da solidão que vende mais
E as câmeras, não mentem?
Uma rua se transmuda numa maré secreta de fome e de espasmo
O útero transparente da cidade se desnuda na rua
Uma rua existe como um rumor, puro ruído de raro observar
Como uma oração de cicatrizes, a esquina dos girassóis ascenderá em cada ressaca de futuro
Assim como um poste sabe como acender e um peixe sabe como boiar e uma criança sabe como atear fogo no útero da mãe, a esquina dos girassóis irromperá em alguma esquina sem nome
Os céus irão invadir os planetários
(“Esquina dos girassóis” – AGC – Os tigres cravaram as garras no horizonte [2010])
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